Velhinha e o mar

Desde que o mundo é mundo, ou melhor, desde que o ser humano saiu das águas e na longa evolução das espécies aprendeu a andar de pé, que a saudade atávica de um passado nem vagamente imaginado o atrai com a força dum imã de volta para o mar.

Dentro do nosso ideal de beleza nada é mais belo do que o mar. Em qualquer cenário, as águas majestosas correndo mansas nos oceanos, ou quebrando atrevidas nos rochedos e nas praias, nos comovem, mexem com a alma, trazem a nostalgia de uma saudade indefinida mas pungente, que balança o peito e deixa entreaberta a porteira das lágrimas.

Mesmo o coração mais duro se comove diante do oceano beijando a terra, em baias , ilhas e cenários de sonho, onde a vida conhece o êxtase, e o divino se aproxima de nós.

Mas, o mar desperta também vontades mais chãs, menos nobres, como dar um mergulho, nadar sentindo a água nos acariciando o corpo, ou pegar uma onda e vir de jacaré, correndo da arrebentação até perto da praia.

São sensações indefiníveis, indescritíveis, que devem ser vividas para serem entendidas.

Não basta serem descritas para que alguém as compreenda. Só quem passou por elas, quem foi parte da imensidão do mar, pode saber o que o mar e o amor pelo mar querem dizer.

E quem as conheceu, quem sentiu no corpo a caricia mágica da consistência de suas águas, nunca mais as esquece, e podendo repete a experiência, porque nela há como que um renascimento, um reencontro com o passado, quando toda a vida se desenvolvia no mar e o oceano era o grande berçário do mundo.

Quem sabe seja por isso que aos 95 anos de idade, por pudor, ela espere escurecer para sair de casa e ir para a praia e entrar no mar para pegar jacarés.

Quem sabe seja por outras razões que só quem tem 95 anos de idade sabe quais sejam… Seja como for, o mar é o seu elemento e é nele que até hoje ela se diverte.

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