Não há poesia na dor
Na dor não há poesia. Na dor há apenas a dor e a solidão desesperada que nenhuma mão minora, que nenhum gesto abafa, que nenhuma palavra acalma.
Na dor há o sofrimento que espanta a poesia, por isso na dor não há poesia.
A dor é a antítese da poesia. A dor é feia. A dor não purifica, nem melhora o homem. A dor simplesmente dói.
Fora, o dia de outono fala da alegria da vida, espelhada no seu céu infinitamente azul e profundo.
Fora, todas as possibilidades se fazem mais do que possíveis porque a vida canta a vida e a alegria de viver. Fora, a dor é um conceito.
Que me importa se em algum outro lugar tem outro homem sofrendo? A minha dor não me permite aceitar a ideia de outras dores no mesmo instante em que ela me tortura. Mas não há poesia na tortura porque não há poesia no sofrimento.
A poesia pode causar sofrimento, a poesia pode trazer a dor, mas o inverso é falso. Não existe poesia na degradação do homem e a dor nos diminui, nos faz pequenos, nos faz ter medo.
A dor, que fora é um conceito, quando bate dentro, machuca. Marca o eu como o carrasco marcava a pele do prisioneiro. Fica para sempre como a cicatriz feita com fogo, como uma tatuagem manchando a alma.
Não há poesia na dor. A lágrima que cai no sofrimento não é a mesma lágrima dos poemas, nem traz a cadência dos versos que engrandecem o espírito. Na dor há apenas a dor.
A solidão e o sofrimento, a solidão criada pelo sofrimento, que espanta o dia e seu canto de louvor; que não vê o azul abrir-se como a estrada mágica que conduz ao infinito e a enorme misericórdia de Deus.
Na dor não há misericórdia, nem boa vontade, nem perdão. Sua essência é o desalento absoluto que tolda a luz e nos promete trevas até o findar dos nossos dias.
Até depois do findar dos nossos dias. Para além da morte e da ressurreição do espírito. A dor nos dá a sombra que apaga o belo da vida, o alegre do sonho, a certeza dum futuro.
É por isso que na dor não há poesia, na dor há apenas a dor. E quando ela dói… como ela dói!
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