Pressione enter para ver os resultados ou esc para cancelar.

Por que é tão difícil se fazer entender?

Quem imagina que deus se contentou em criar as diferentes línguas para castigar os homens pela audácia da construção da torre de babel, está completamente enganado. O criador foi muito além, e o foi de forma extremamente sutil, dando-nos a impressão de que depois que cada povo decidisse pela sua língua tudo estava arrumado e a comunicação restabelecida, sem interferências ou estáticas.

Cada povo ficou com sua língua, outros povos criaram novas línguas, mas a comunicação entre os homens não melhorou. Pelo contrário, entre os que falam a mesma língua, ela tornou-se quase que impossível, com todo mundo falando tudo e ninguém entendendo nada.

E não é só má vontade do que fala ou do que escuta. As pessoas simplesmente não conseguem se fazer entender, porque as palavras, mesmo quando ditas na mesma língua, têm significados diferentes, ainda que apenas em pequenos detalhes.

A soma destas diferenças quase imperceptíveis faz com que uma conversa absolutamente clara para quem fala seja também absolutamente clara, mas com outro significado, para quem ouve.

E a confusão está lançada, com os dois completamente convencidos de suas posições invariavelmente antagônicas, por conta do desentendimento original, nascido da interpretação pessoal de cada um.

Daí para frente a conversa fica incompreensível. Os pontos de referência confundem ao invés de balizarem. As semelhanças tornam-se diametralmente opostas, o branco de um vira o negro do outro, e a má vontade acaba substituindo o interesse em se chegar junto, motivada por uma série de desentendimentos conceituais que levam a discussão, depois de pouco tempo, para o campo da emoção, impedindo deste ponto em diante qualquer chance de acordo, ou de um simples ponto em comum.

Neste momento é básico parar. Meter o pé no breque, respirar fundo e contar até dez, para dar ao outro tempo para também perceber o que está acontecendo e, só então, com muita calma e enorme cuidado, voltar para o tema, prestando atenção para não machucar e para não ser machucado; prestando atenção para não ultrapassar o ponto de ruptura, com a conversa em outro tom e com outro enfoque, onde o mais importante é quem ouve e não quem fala.

___
Siga nosso podcast para receber minhas crônicas diariamente. Disponível nas principais plataformas: SpotifyGoogle Podcast e outras.

Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.