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Quem dorme primeiro?

[Crônica do dia 25 de junho de 1999]

Dizem alguns alfarrábios antigos, encontrados nas ruínas de Ur, na Caldéia, que os filhos, como ordem natural da coisas, devem dormir antes dos pais. E o antigo texto cuneiforme encontra eco nos hieróglifos egípcios, gravados nos muros de Karnac, além de constar das versões mais antigas da Cabala e de velhíssimos textos chineses.

Em todos eles e em vários outros, aparece, fruto da sabedoria e da observação humana, que os filhos devem dormir antes dos pais. E regra tão velha deveria estar consolidada, não cabendo mais qualquer discussão sobre ela, como aconteceria com as sumulas vinculantes, se a reforma do judiciário brasileiro fosse aprovada rapidamente.

Só que a teoria na prática costuma ser outra. Por mais que a gente insista, querendo que os velhos conceitos que pautaram as civilizações antigas ainda se apliquem nos dias de hoje, é inútil, eles são letra morta e, no máximo, fazem os outros rir.

Do que, ninguém sabe, porque dormindo tarde, os filhos acordam com um sono do cão, que os faz chegar na escola mais ou menos como Zumbis, mal e mal parando em pé, e certamente sem condições de fazer a prova para a qual ele não estudou, logo na primeira aula.

Chova ou tenha lua, indiferentes ao céu, os filhos e as filhas, depois que fazem 14 anos se julgam os donos do mundo, e que pega mal um dono do mundo dormir cedo, ainda que cedo seja mais ou menos onze e meia ou meia noite, e que amanhã cedo tenha que estar em pé às vinte para as sete.

O importante é bocejar, mas não dar o braço a torcer. Filho ou filha que tem 14 anos não dorme antes das 11 e meia e ponto final.

Se os pais estão com sono, problema deles ou eles que durmam, a filha, que é o meu caso, continua impávida, como D. Pedro nas margens do Ipiranga, acordada até mais tarde, montando e desmontando seus armários.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.