A cara de São Paulo
[Crônica do dia 6 de março de 2006]
A Império da Casa Verde é bicampeã do carnaval paulistano. Para uma escola com 4 anos no grupo especial é um desempenho fantástico, que vai a colocando entre as grandes de todos os tempos, pela eficiência, pela riqueza de seus figurinos e pela sofisticação do seu desfile.
Eu estou longe de ser um entendido em samba e em desfile de escola, mas se a Império é bicampeã e ninguém contestou o resultado, com a briga ficando na outra ponta, em torno do último lugar na classificação e da queda da Gaviões da Fiel, é porque ela merece.
Mas o que me interessa porque só acontece em São Paulo, é um detalhe que a televisão mostrou depois da apuração, quando todos já sabiam quem era a campeã: o mestre sala da Império da Casa Verde é japonês. Japonês do Japão, vindo para o Brasil no ano passado.
Depois de convencer a direção da escola que ele poderia ser o mestre sala, ele provou que podia, foi e tirou a nota máxima num quesito difícil e que tem o mesmo peso que a harmonia, a bateria.
Pode parecer incrível, mas mestre sala e porta bandeira têm o mesmo peso que todos os outros quesitos que dão a nota da escola de samba. Os dois sambistas têm que ser perfeitos. Um erro, uma derrapada fora de hora, um escorregão, e perdem pontos preciosos. Os eventuais pontos da vitória, indispensáveis para a soma dar a nota máxima.
Pois o responsável pelo 10, o herói da façanha não é afrodescendente, nem mulato, nem malandro de gafieira. É um japonês vindo do Japão no ano passado, disposto a viver a enorme democracia do samba, que em São Paulo se abre mais ainda, num retrato vivo dos parâmetros da cidade, aberta ao inusitado e generosa com os vencedores.
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