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É proibido cortar árvores já cortadas

[Crônica de 7 de julho de 1997]

A prefeitura no sagrado exercício de sua missão, zelando pelo bem-estar do povo e pela beleza e qualidade de vida da cidade, proíbe, proíbe terminantemente que o cidadão, seja ele quem for, corte árvores já cortadas.

O sagrado direito de cortar árvores, sejam elas cortadas ou não, é da prefeitura e esse direito, que poderia ser transferido através de uma carta de sesmaria, não será jamais transferido, pelo menos não por esta administração, que pretende zelar por todas as árvores que já foram cortadas em São Paulo.

Pode vir Exército, Aeronáutica, DAC, DSV, o ex-prefeito, até o irmão do Papa, que a administração não transigirá em hipótese alguma. Árvores já cortadas não podem e não serão cortadas, sob risco de reações em cadeia terríveis, coordenadas por madeireiros malaios, que prometem entre outras coisas introduzir tigres de bengala em nossos parques e bosques, começando pelo Siqueira Campos, também conhecido por Trianon.

Sob a égide da legalidade e da transparência mais absoluta, a edilidade piratiningana dará o suporte necessário para que seu alcaide, imbuído dos mais altos anseios de paz e ordem, combata energicamente, inclusive na semana de recesso do congresso convocado para trabalhar nas férias, o corte das árvores já cortadas.

Ninguém, em parte alguma do mundo poderá alegar que São Paulo não é uma cidade politicamente correta, onde o corte das árvores já cortadas é visto como ato da mais selvagem barbárie.

Árvores não cortadas podem ser cortadas. mais ainda, dependendo da espécie, elas devem ser cortadas. o que não se admite, e não será jamais admitido, é que alguém pretenda cortar duas vezes uma árvore que já foi cortada.

Árvores cortadas são como os meninos de rua. elas são intocáveis. Por isso que não podem ser cortadas de novo.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.