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A Cruz Torta revisitada

[Crônica de 30 de agosto de 2000]

Eu já falei da igreja da Cruz Torta, no começo do bairro de Alto de Pinheiros, logo abaixo de onde a Pedroso de Morais fica mais arborizada.

É uma igreja moderna, de concreto aparente, que tem como marca registrada uma cruz torta no jardim à sua frente. Meu vínculo com ela é relativamente forte, primeiro porque foi lá que minha filha Xica foi batizada e, segundo, porque é a igreja que minha mulher e minhas filhas frequentam.

Com suas linhas atípicas, no meio de um jardim que também não é normal ao redor das igrejas paulistanas, ela é uma simpática igreja de bairro que não quer ser mais do que uma igreja de bairro, ainda que tendo potencial para isso.

Fazia tempo que eu não entrava nela, o que me fez perder a referência do seu tamanho e como ela é bonita por dentro.

A imagem que eu tinha era da sala onde minha filha foi batizada, iluminada com uma luz avermelhada, estranha e escura, que dava para a igreja um certo ar de câmera do purgatório, em vez de casa de Deus.

Outro dia, passeando de bicicleta, passei na sua frente e decidi entrar. Era um domingo, entre as missas, de forma que a igreja estava praticamente vazia, me permitindo observar sua arquitetura e seus detalhes e ver como ela é bela e como, com suas linhas retas de concreto cinza, consegue ser quase poética e induzir o homem a pensar em Deus e se aproximar do divino.

Como se não bastasse, sua forma larga, com os bancos confortáveis se estendendo de um lado ao outro de seu amplo salão, deixa os fiéis mais perto do altar e do sacerdote, dando à missa um caráter mais íntimo, de cumplicidade no espanto da revelação do mistério – o mesmo caráter que ela devia ter quando São Pedro e São Paulo cruzavam o Mediterrâneo contando da glória de Deus, nas maravilhas do filho.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.