O silêncio da cidade
São Paulo não para, não dorme, não descansa. 24 horas por dia a cidade segue em frente, corre atrás dos faróis, para nos semáforos, pergunta cadê os marronzinhos? E a resposta é o silêncio. O silêncio que não é silêncio, mas é mais expressivo, o silêncio é a falta de resposta. Esse o silêncio que dói mais, o que apesar do barulho, não dá a resposta.
Em São Paulo o silêncio é artigo tão raro que nem na torre da Catedral ele pode ser encontrado. Não é. A torre da Catedral atrai os ruídos em volta, chama as buzinas dos ônibus, os gritos dos pregadores, as consciências pesadas que caminham pela Praça da Sé prometendo o inferno e entregando meio purgatório.
Promessas são feitas para serem quebradas, como os tratados de paz. Quem acredita em promessa acaba feito os ameríndios dos filmes de cowboy, confinados em reservas longe de suas terras nativas, onde o ouro brota dos rios em pepitas enormes que enriquecem o homem branco e garantem a chegada da cavalaria.
Silêncio, a mata dorme, mas no sono da mata seus sonhos se materializam nos gritos, pios e rugidos que fazem contraponto ao ronco do bugio.
A onça subiu na árvore no centro da cidade. É complicado tirar uma onça parda do alto dos galhos da grande árvore onde ela se refugiou. Onça é onça, se chegar perto, ela morde.
O caminhão entra na Marginal rugindo fumaça pelas chaminés atrás da cabine. Sabe que não dá, mas toca em frente mesmo assim, 5 minutos depois está entalado debaixo do viaduto. O trânsito para. A cidade para. Não tem o que fazer senão esperar tirar o caminhão.
Enquanto isso o bebê dorme no seu berço, alheio ao movimento em volta, ao barulho que não cessa. Ao silêncio que às vezes realça o barulho.
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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.