O jogo do poder

[Crônica de 3 de junho de 1998]

Poder, poder… Poder voar! Sair do chão sem avião ou asadelta, erguer-se bem alto e ver o mundo do alto, pequeno como uma cidade de bonecas, onde a correria da vida passa como num filme, distantemente amiga, despertando sensações ternas que trazem lágrimas aos olhos.

Poder voar, sair da vida para entrar na eternidade, carregado por um minuto de sonho, onde a vida deixa de ser vida para se transformar em aventura e nos equiparar a Peter Pan e nos deixar desvendar os mistérios da terra do nunca.

Poder voar nos sonhos todos que de repente se materializam no som de uma única palavra quente e próxima que fala mais à alma do que aos ouvidos. Subir, subir com o vento, ou como o pensamento que escapa do mais escondido do coração e nos deixa vermelhos, mesmo não tendo sido revelado.

Que nos deixa contentes mesmo não tendo sido dito. que nos deixa com vontade de dividir… o sol, o dia, a alegria de estar vivo.

Subir como o condor que atravessa os andes. Ultrapassar a barreira da gravidade e levitar pelo espaço, por Andrômeda, Magalhães e outras galáxias tão distantes que sua existência seja sutilmente percebidas apenas nas vibrações que vêm do fim do espaço, porque sua  luz já não nos alcança.

Voar como as aves para além dos muros e das torres. Flutuar solto no céu feito uma nuvem num meio-dia de outono. Esquecer do mundo e de suas dores; das guerras, da miséria, da luta insana pelo pão nosso de cada dia.

Acreditar que tudo é possível, e que a vida é boa, e que a dor não existe.

Aceitar a mão que se estende e levá-la junto na viagem.

Dividir com ela cada momento e cada descoberta; cada passo e cada pouso.

Dividir com ela a felicidade mágica que nasce às vezes, sem outro porquê, senão a imensa vontade de ser, sem máscaras e sem medo, aquilo que realmente somos. 

Poder voar e abraçar o mundo, na vertigem do amor!
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