A diminuição do verde urbano
[Crônica de 15 de setembro de 2003]
Não sei que estudo, de novo, traz dados impressionantes sobre a diminuição do verde na cidade de São Paulo. Em dez anos mais de 5 mil hectares de verde desapareceram, engolidos pela selva de concreto e asfalto, muito mais terrível que qualquer selva natural.
Os monstros que correm aqui não correm por lá, por isto as florestas são lugares bucólicos, onde o ser humano encontra paz, sentado numa raiz de árvore, fumando um cigarro de palha, com uma espingarda no colo, sem atirar em nada, fingindo que está caçando.
Não tem nada como fingir que se está caçando e ficar vendo o mato, ouvindo o mato, sentindo o mato na brisa que passa pelas folhas, nos cheiros, nas sombras das árvores.
Mas a cidade insaciável vai devorando o verde que aparece na sua frente, como se fosse indispensável recuperar os séculos em que quase não cresceu, permanentemente esvaziada por um sonho novo, por uma nova expedição, correndo norte e sul; leste e oeste, arrancando das entranhas das terras mil Eldorados que mudaram a cara do mundo e a riqueza das nações.
Não há mato, não há campo, cerrado, ou simples terreno baldio que não esteja permanentemente ameaçado, se estiver a menos de 20 quilômetros da periferia mais distante.
São Paulo não para. Sua boca escancarada engole sertões inteiros, para depois jogar nas ruas da cidade uma fauna inesperada, mas deslumbrante, com capivaras, pacas, tatus, jacarés e até onças pintadas aproveitando as vantagens da civilização para uma refeição mais farta e uma soneca tranquila, escondidos nos desvãos da nova selva erguida pelo homem, muito mais cruel que a mata verde dos dias passados.
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