Alguns engraxates
[Crônica de 16 de abril de 2010]
São Paulo é uma cidade interessante por uma série de razões, mas das mais importantes são os tipos que habitam nela, e que fazem a diferença, pelo inusitado, pelo jeito, pela postura, pelo fazer ou não fazer.
Existem cantos que não têm dono. Todo mundo passa, alguns até param, mas ninguém ocupa. Outros têm dono, quer dizer, aquele espaço tem a cara e o jeito de um determinado cidadão. De alguém que faz a diferença e que se confunde com o lugar.
É assim no Largo do Ouvidor, em frente do restaurante Itamarati. Ali é o ponto do Seu Pereira, um dos melhores engraxates da cidade e pessoa única, pelas qualidades e jeito de ser.
Mestre na arte de tratar o sapato, Seu Pereira tem requintes de sofisticação que as grandes sapatarias do mundo jamais pensaram ser possíveis. O resultado é um belo papo durante a engraxada e um sapato novo no final.
Na Praça João Mendes tem um engraxate que é o oposto do Seu Pereira. Nem sei se ele engraxa bem. Eu nunca engraxei com ele. Ele é preguiçoso e sempre pede para você engraxar com o colega ao lado, porque ele nunca tem a graxa da cor do seu sapato.
Já no Largo do Arouche impera o Seu Luiz. Profissional tão competente quanto o Seu Pereira, Seu Luiz dá um trato raro em qualquer sapato. Mas com outra toada, muito mais falante, e com outro jeito de fazer. Seu Luiz tem outro jeito de bater papo, outros interesses e outros assuntos, que ele domina como pouca gente.
Enquanto Seu Pereira é discreto, Seu Luiz é extrovertido. Solta o verbo, conta casos, ensina a missa ao vigário com um sorriso nos lábios. Cada um ao seu modo são os 2 melhores engraxates de São Paulo.
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