O inusitado é parte da paisagem
[Crônica de 22 de outubro de 2009]
São Paulo é mais que uma cidade, é um oceano vivo e constante, espalhado pelo planalto. Anárquica, a metrópole conserva características do período colonial, quando sua população tinha muito de nômade, pelo sangue indígena que corria em suas veias.
Nascida taba, a mudaram de lugar para se transformar em vila, o que aconteceu apenas depois de 1560, quando as poucas casas dos europeus rodearam a igreja jesuíta, dando início ao que viria a ser a maior concentração urbana abaixo do equador.
Desde o mais remoto começo, o inusitado faz parte da vida paulistana. Nos idos de 1550 os padres batizavam os prisioneiros condenados à morte porque os índios achavam que a carne dos cristãos tinha gosto ruim. Poesia pura foi Tibiriçá exigir que um irmão jesuíta se casasse com sua outra filha, Terebé, dando início à divisão do poder na região do planalto.
Mas mais poético ainda foi o dito irmão gostar da vida de casado e depois de ficar viúvo, casar-se de novo, dando origem a um dos mais sólidos troncos paulistas, de onde descende o poeta Paulo Bomfim.
Desde sempre o inusitado faz parte do cotidiano da cidade. Isolada no alto da serra, a vila garantia a impunidade de seus moradores. Na época colonial, quem comandava as fazendas eram as mulheres. Até o final do século 18 se falava tupi dentro de casa. E foi na vila acanhada que D. Pedro I proclamou a independência.
Feia, suja, pobre, meio que sem futuro, a vila colonial deu lugar a cidade imensa, mas até hoje o inusitado segue sendo parte de sua vida. Se você dúvida, olhe para seu lado.
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