Antes era melhor
Diz a lenda que antes era melhor. A dureza da vida e a nostalgia do passado faz a fantasia voar e sonhar com o que nem sempre foi como o sonho mostra, se é que um dia existiu.
Faz tempo, numa conversa sobre os tempos da mocidade, quando ser feliz era fácil e o cavaleiro andante vencia os monstros para garantir o final feliz, minha prima Maiá jogou um balde de água fria nos otimistas perguntando para as mulheres da roda: Vocês se esqueceram de quanto vocês choraram porque o menino amado não nos amava?
É verdade, temos a tendência de esquecer o feio e o triste para guardar as lembranças boas, as luas cheias no terreiro, os pores do sol na cabaninha, o Guarujá, os passeios de barcos, as pescarias, as primeiras pranchas de surf.
Mas a vida é bem mais do que isso. Tem todo um outro lado, ou vários lados, que tapamos e escondemos debaixo do tapete e, vinte anos depois, estão quase esquecidos e, quarenta anos depois, se são ressuscitados, renascem com uma cor que nunca tiveram, porque a vida pega mais ou menos pesado até para quem tem sorte e acha que viver é fácil.
Ninguém vai dos 12 aos 20 anos sem dar muita topada, sem tomar muita porrada, sem sentir no mais fundo da alma a dor profunda de não saber o quê ou por quê.
É assim porque é assim, geração após geração, civilização após civilização, pai depois do avô e filho depois do pai.
É verdade, tem gente que teve um antes de princesa e o agora é de gata borralheira. Tem quem nadou sem esforço correnteza abaixo e agora tem que subir o rio nadando de costas, com jacaré passando ao lado.
Faz parte da vida, mas isso não quer dizer que antes era melhor. Quer dizer que você não está vendo o bom e o belo da sua vida agora.
___
Siga nosso podcast para receber minhas crônicas diariamente. Disponível nas principais plataformas: Spotify, Google Podcast e outras.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.