Os dias bons
Existem dias em que no momento em que a gente acorda fica claro, sem nenhuma razão mais explícita, que ele vai ser uma tragédia. Que tudo dará errado, que as coisas não correrão da melhor forma e que o ideal seria ficar na cama, torcendo para ela não desabar ou casa pegar fogo.
São dias negros, em que nada funciona e nos quais não adianta acender vela ou fazer promessa para o anjo da guarda, porque ele está de férias pescando truta em Campos do Jordão.
Mas existem dias que também sem explicação, na hora em que a gente sai da cama, vem a certeza de que tudo dará certo e que o impossível está ao nosso alcance.
A sensação começa de forma indefinida, em algum lugar dentro da gente, e cresce lentamente como um carinho gostoso, se abrindo num sorriso tranquilo que ri mais com os olhos do que com a boca.
Do outro lado da janela aberta uma manhã radiosa nos espera de braços abertos. Na palmeira em frente um sabiá canta, nos contando que também está de bem com a vida e que a manhã para ele é tão maravilhosa quanto para nós.
Ao sairmos da cama, o cheiro de café quente nos dá o bom dia da casa, misturado ao cheiro maravilhoso do pão fresco, recém-chegado da padaria.
Tudo conspira para a nossa felicidade. Aliás, a conspiração é interna e se serve dos objeteis do cotidiano para nos fazer perceber que o dia vai ser lindo e que tudo vai dar certo.
A reunião para fechar um novo negócio com o cliente mais chato de todos flui como uma valsa; o trânsito permanentemente empacado entre a casa e o escritório milagrosamente rola no ritmo dos grandes rios em busca do mar; a alegria instala-se na alma, impedindo qualquer pensamento ruim, qualquer ideia negativa.
E o dia corre solto, entre conversas leves e momentos de inefável felicidade. Momentos que são divididos com quem está próximo, porque são momentos grandes demais, bons demais para serem só nossos.
A vida se faz em poesia; em música que fala à alma; em sonhos tornados possíveis, porque tudo dentro da magia do dia, é de novo viável.
E a noite chega e nos encontra na cama, deitados, com a certeza de todos os preços pagos e do dever cumprido, não por ser dever, mas porque enganar o ruim e o feio é um enorme prazer.
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