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O trânsito nas férias

[Crônica do dia 25 de janeiro de 2000]

É incrível, mas nem a chuva torrencial que cai nos dias de verão consegue piorar muito o trânsito de São Paulo durante as férias de janeiro.

A cidade muda de jeito, fica com outra cara, mais mansa e mais amiga, menos neurótica e mais compreensiva, como se a falta dos carros que atravancam suas ruas no resto do ano fosse capaz de mudar-lhe o humor, deixando-a leve e de bem com a vida.

15 minutos é muito tempo. Ao contrário dos dias normais, dos chamados dias úteis, 15 minutos é suficiente para irmos e voltarmos dos lugares mais improváveis e que nos outros meses são quase que inacessíveis, por conta dos congestionamentos infindáveis que se arrastam como uma enorme sucuri que come a ponta do próprio rabo.

Até os estafermos que se julgam donos das ruas diminuem a marcha e reduzem o número de barbaridades que praticam, colocando a vida de quem não tem nada com isso em permanente perigo.

As cruzadas de frente, as fechadas, os sinais atravessados no vermelho, enfim, a lista infindável dos desmandos contra as regras de trânsito se reduz, perde a agressividade que mata mais do que os assassinatos nas periferias, permitindo aos motoristas sem índole assassina saírem de casa com menos medo do que nos dias ditos normais.

É uma quase festa. Uma chance para se ver que a cidade não é cinza e agressiva, mas que tem nuances, tem detalhes escondidos em vãos e sombras que revelam um outro lado, muitas vezes francamente belo, e que, por conta do trânsito, acaba não sendo visto, ou, quando muito é vagamente pressentido.

Não fossem as chuvas que caem sabendo de antemão que já ganharam e que vão inundar as ruas, parar os carros e causar danos, janeiro poderia, em comparação com os outros meses do ano, ser considerado uma antevisão do paraíso.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.