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O nome da praça

[Crônica do dia 6 de outubro de 1997]

Ninguém pode pretender ser praça antes de morrer. Nem praça, nem rua, nem viela. Avenida então é inimaginável, e pontes e viadutos então nem se fala.

Eu sei que é assim, e eu sei que é assim que tem que ser. Na minha posição de líder cívico, de representante das camadas mais necessitadas da população abandonada – não por mim, diga-se de passagem – pelos políticos inescrupulosos que só se lembram dela nos anos de eleição, eu sei que é assim que tem que ser.

Vou ainda mais longe, ouso até insistir no tema, porque é ele quem dá maior relevância para que fique claro os limites da vida pública e das honras devidas aos construtores da pátria, que se sacrificam no desempenho da função pública, matando-se de trabalhar nas poucas sessões em que um não dorme e o outro vai.

Mas a concessão da honra máxima, de virar logradouro, seja praça, rua, ou até um simples beco, esta deve passar pelo crivo severo da análise detalhada dos atos e feitos do futuro homenageado, que só pode ser honrado – se aprovado no teste de cidadania – após sua morte, de preferência de forma gloriosa, imolado em altar aceso com o fogo purificador das grandes ações em nome da humanidade.

Seria pretensão minha, seria… justo eu que Deus fez humilde, imaginar, ainda em vida, ter minha graça gravada em placa azul e com letras brancas, nomeando logradouro localizado em minha base eleitoral.

Quem sou eu, mísero servidor do povo, devoto apóstolo da lei que manda dar ao próximo, para pretender ainda em vida virar nome de praça?

Não, minha proposta não visava – ainda que merecida – uma auto-homenagem. quem eu queria homenagear, imortalizando-o com o nome duma praça, era um cidadão exemplar, por acaso homônimo, realizador de obra meritória em prol dos mais sofridos. Se ele não tinha sobrenome? Bom, isso é outra estória…

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.