Debaixo do asfalto

Debaixo do asfalto nosso de cada dia, ou do que sobra dele, dependendo de onde, há ou não há mais coisas do que concebe nossa vã datilografia.

Pode ser que sim, mas pode ser que não. Então, é preciso reunir a municipalidade, as concessionárias de serviços públicos e as ONGs com fins lucrativos em volta de uma mesa, trancar a porta e só reabrir quando chegarem a um acordo mais improvável que decidir hoje quem será o próximo Papa.

Em cima das ruas tem asfalto, ou deveria ter, o que não é uma certeza absoluta pelas mais variadas razões, com exceção da utilização de artefatos atômicos para explorar a pesca da sardinha nas águas do Tietê.

A verdade é que embaixo da cidade existe outra cidade, com ruas, tuneis, rios subterrâneos, encanamentos, buracos, bueiros, fios, fibra ótica e o mais que se imaginar, incluídos cadáveres de todas as espécies. 

A consequência desse samba alucinado é que ninguém hoje tem um mapa atualizado da realidade do subsolo paulistano. Daí ser quase impossível se realizar qualquer obra que perfure o solo sem atingir algo que não deveria estar, mas está. 

Como se não bastasse, a coisa complica muito quando os proprietários do que está embaixo da terra se esquecem, deliberadamente ou não, de informar a prefeitura que vão realizar obras em suas redes.

Às vezes furam as redes dos outros, ou iniciam curtos-circuitos, ou arrumam vazamentos e até conseguem trabalhar sem causar nenhum dano ao vizinho mais próximo. O que nenhum deles consegue, até porque não tenta, é tapar os buracos que fazem para atingir os subterrâneos do terror. No anseio do lucro, o máximo que fazem é um remendo malfeito e com pouco asfalto que em pouco tempo reabre como uma cratera. 

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