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Os carros quebram

[Crônica de 16 de julho de 1999]

As afitas ardem e doem e os carros quebram. São duas verdades simples e tão claras quanto a certeza da morte ou a dor de dente que chega de noite, nos acordando e impedindo de voltar a dormir.

Poucas dores são mais tristes do que a das afitas e poucas situações são mais estúpidas do que ficar dentro de um carro quebrado, com o pisca alerta ligado, e um bando de gente buzinando atrás.

Eu sei por experiência própria, renovada faz uma semana, quando eu vinha para a rádio e o garfo da embreagem do meu carro soltou, impedindo-me de trocar a marcha, bem na subida que sai da ligação leste oeste e entra na avenida Liberdade. 

Desde manhã cedo que eu estava desconfiado. O engate das marchas estava difícil e a embreagem muito dura. Mas, a esperança é a última que morre, e por conta dela, achei que dava para consertar na semana que vem, esquecendo a base da lei de Murphy, que diz que se alguma coisa ruim tem que acontecer, ela vai acontecer na hora mais errada possível. 

Pois para mim foi. Eu já estava atrasado por causa do trânsito, já tendo inclusive perdido as manchetes das seis horas, quando o tal do garfo decidiu que era hora de soltar e soltou.

Como compensação pelo vexame, descobri que o serviço 24 horas do meu seguro é rápido e que existe um mecânico chamado Paulo, que tem oficina na rua Barão de Ijuí, que eu nem sabia que existe, que é muito bom.

E foi ele quem me resolveu a vida, primeiro indo até a avenida Liberdade, onde o carro estava parado, com o pisca alerta ligado, e, depois, na sua oficina, onde ele regulou a embreagem, deixando-a muito melhor do que era antes.

Também redescobri a boa vontade e a solidariedade humana, no ato dele sair da sua oficina, onde estava trabalhando em outro veículo, para ir comigo, às seis da tarde de uma tarde fria, ver o que tinha acontecido no meu carro. 

É gente como o Paulo que faz São Paulo valer a pena e eles existem, num número muito maior do que a gente pensa.
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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.