Os sabiás desembestados
Os sabiás são os donos da vez. Cantam de manhã, de tarde e de noite como se a vida fosse uma ópera interminável, na qual eles são os grandes cantores.
Eu gosto do canto dos sabiás, eles falam do interior de antigamente, lembram as músicas caipiras e um Brasil que não existe mais faz muito tempo. Tudo muda, no passar do tempo nada se mantém eternamente, as pessoas envelhecem e morrem, os países envelhecem e não sabem como sair do enrosco. Até os deuses perdem sua divindade, substituídos por outras verdades definitivas, como a Inteligência Artificial e as redes sociais.
Antes era de um jeito, agora é de outro. Décadas atrás, eram as sinfonias de pardais que saudavam o alvorecer. Faz tempo que os pardais perderam relevância, pelo menos na cidade de São Paulo. Até os tico-ticos, que quase desapareceram, hoje em dia reocupam seus espaços, enquanto os pardais, sabe Deus por onde andam.
Diz a lenda que a razão do declínio da supremacia dos pardais foi o fim dos sacos de aniagem. Era com suas fibras que eles faziam os ninhos, como não tem mais saco de aniagem, não tem material para os pardais nidificarem e aí eles mergulharam na decadência.
Enquanto isso, os sabiás que sempre viveram na cidade, mas em doses homeopáticas, aumentaram exponencialmente de número. Ocuparam novos espaços, se espalharam pelos quatro cantos da metrópole e fazem a festa 24 horas por dia.
Os sabiás são os mensageiros das árvores, são um correio que funciona e não dá prejuízo. Contam para elas o que acontece em volta ou em regiões distantes, permitindo, com suas informações muitas vezes confidenciais, que as plantas se preparem para enfrentar cada dia, um depois do outro.
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