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Lá atrás

Às vezes a pancada bate dura e a gente descobre que não é bem assim, que as coisas não acontecem no ritmo que nós queremos e muito menos com o final que nós gostaríamos. Não, a vida tem suas pegadinhas e nos leva na conversa com jeito de que vai dar tudo certo, pra, depois, no meio do jogo, mudar tudo.

De repente o céu fica embaixo e a terra em cima. O sol brilha de noite e o cruzeiro do sul dá o rumo do dia. Não tem o que fazer, é hora de pedir para a Terra parar, descer, encostar num barranco e esperar a maré mudar.

Numa fase dessas, de repente me vi lembrando de meu pai, não do homem de terno e gravata, mas do homem solto, pescando robalo, com sua viseira para não molhar os óculos, camisa caqui e botas de borracha.

Cananéia não era fácil, nem perto. As primeiras vezes que fui para lá foi de Kombi, duas, uma atrás da outra, porque a viagem era pelas praias do litoral sul de São Paulo e se uma encalhasse a outra puxava.

Meu pai teve duas casas no Cubatão de Cananéia. A casa velha, com Tio Júlio Salles, o Lineu Salles e o Afonso Botelho, e a casa nova, com Tio Júlio Salles e tio Ruy Mesquita. Conheci as duas, mas sempre fiquei na casa nova. A luz elétrica era fornecida por um gerador e a geladeira funcionava a querosene.

Os barcos de pesca eram inicialmente, “skifs” de madeira que depois foram substituídos por outros, de alumínio, fabricados na Usina. Quem carregava os motores dos barcos pelo barranco entre a casa e o canal, era o Xicão, uma espécie de xerife do Cubatão, casado com a caseira da nossa casa, Dona Angelina.

A Cananéia que eu conheci ficou décadas para trás. A casa foi vendida, nunca mais fui lá. Mas sua lembrança segue viva e as histórias que eu vivi naquele tempo são boas para fazer esquecer o que não vai bem.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.