Quarta feira de cinzas

Acabou o nosso carnaval. Ninguém pula, ninguém dança, ninguém vai atrás do trio elétrico que segue pela avenida, sem som, sem música, sem gente pulando em cima, no ritmo lento do trânsito da cidade de ressaca.

Centenas de blocos vieram, viram e passaram. Agora só no ano que vem, quando milhares de pessoas voltarão às ruas, para seguirem o trio elétrico que movimenta cada bloco, cada festa, cada turma que faz do carnaval de São Paulo um mar de gente, que segue na velocidade da maré humana se movendo lentamente pelas ruas e avenidas.

Você não sabe mais o que sabia ontem, porque o que era deixou de ser e a vida retomou seu curso, sem fantasia, na quase-ilusão da vida que é a vida de todos nós.

Eu não sei mais o que sabia ontem, quando ontem era a realidade e a realidade sambava pela cidade, entre goles de cerveja gelada, braços pra cima e mãos se encontrando no meio da folia.

Nós não somos mais o que éramos porque o mundo segue em frente e, depois da terça-feira gorda, chega a quarta-feira de cinzas.

Antes era cedo, agora já é tarde. Outro carnaval só no ano que vem. Até lá, tem festas para espantar o tédio, festas que nos encherão de tédio, festas a que iremos e festas a que não iremos, porque cada um de nós tem o livre arbítrio e pode decidir como passar o tempo, na corrida de cada um em busca do sonho pra criar outra realidade em que ser herói é possível e ser feliz, uma mera questão de cruzar os dedos.

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Adeus pra você que ficou em algum ponto no meio da avenida. Adeus. Adeus pra você que ficou com alguma coisa de mim, alguma coisa que não é mais minha, é sua, mas você não sabe mais o que é, nem onde escondeu.

Adeus. Agora é hora de retomar a vida com o sol batendo nos olhos e uma dor de cabeça que não passa.

Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

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