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A solidão da cidade grande

Na cidade grande milhões de pessoas cruzam os mesmos caminhos todos os dias. Vão e voltam pelas mesmas trilhas, pelas mesmas ruas, tomam os mesmos ônibus, descem e sobem dos mesmos vagões, dos mesmos trens ou metrôs.

A cada dia se cruzam, se entrecruzam, se batem, se encontram, mas não se cumprimentam, nem trocam palavras, exceto para se xingarem, no transito infernal, na fechada sem querer, na entrada de propósito, na brecada súbita para não matar um motoqueiro.

Cada um segue seu caminho, indiferente ao destino dos outros. Ao que eles pensam, se é que pensam, ou ao que não pensam.

Na cidade grande é cada um por si e o diabo por todos, enquanto Deus dá risada, vendo o inferno recriado em cima da terra para economizar trabalho para o anjo caído.

Nada, nem ninguém, comove. A beleza é um conceito etéreo, distante. A amizade um mal desnecessário e o ódio permeia as relações, na inveja ou no ciúme que derruba a boa vontade.

Não sei nada sobre você, nem quero saber. Me deixe em paz, no meu canto. Eu não atrapalho, não amolo, não ocupo espaço. Tenho vergonha de qualquer sentimento que me faça vagamente humano.

O resto, são distâncias a serem mantidas, dentro do elevador, na padaria, no meio da rua, ou no restaurante lotado, onde ninguém se cumprimenta.

Falar com o outro é chato feito picada de pernilongo. Falar pra quê, se tudo acaba em seguida, esquecido, como o nome da praça que a gente passa todo dia. Fique na sua que eu fico na minha. É triste, mas é assim que tem que ser

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.