Os pássaros do verão
Quem acorda de madrugada na primavera e acorda de madrugada no verão, sabe que os pássaros que cantam de madrugada na primavera não são os mesmos que cantam nas madrugadas do verão.
Dizem que a noite foi feita pra gente dormir. Só que de vez em quando nos esquecemos disto e acabamos acordando quando ainda está escuro e daí pra frente, brincamos de croquete, rolando na cama, sem conseguir achar o sono de novo.
É nestas horas, normalmente difíceis, quando todos os fantasmas saem das caixas e as lembranças ruins crescem mais do que as boas, que os pássaros acabam se transformando na tábua de salvação da madrugada dos paulistanos.
Na primavera o dono da aurora é o sabiá, ou melhor, os sabiás, que cantam desde a primeira luz até o dia clarear, chamando as fêmeas para acasalar.
No verão, não. No verão, de madrugada os sabiás, provavelmente satisfeitos com os romances de primavera, dormem até mais tarde, deixando a execução da sinfonia da aurora de São Paulo para uma série de outros pássaros, que mais piam do que cantam, como se fizessem experiências pós-futuristas, para encontrar o acorde perfeito e mudar as noções fundamentais da música.
De qualquer jeito, ouvi-los é uma benção para quem está acordado, brincando de croquete, acossado pelos fantasmas do passado e pelo medo do futuro.
Bem aventurados pássaros que eu não sei quais são, mas que dividem a madrugada comigo, me dando apoio na hora mais dura.
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