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Rolando Boldrin

Tem gente que tem olhos que falam. Mais do que isso, tem gente que tem os olhos bons. Olhos que olham com carinho, com empatia, com vontade de dividir. Ronaldo Boldrin tinha os olhos assim. Ele olhava a câmera e era como se seu olhar atravessasse a lente, entrasse na sua casa e te olhasse diretamente nos olhos, com seus olhos bons.

Rolando Boldrin foi, com Inezita Barroso, o guardador da enorme herança do campo brasileiro. Desse interior que não existe mais, substituído pelo agronegócio alucinante que retira a poesia do entardecer nas máquinas gigantes que aram, plantam e colhem centenas de alqueires por dia.

O Brasil de Rolando Boldrin tinha o canto do nhambu, o voo das rolinhas, os sabiás anunciando as madrugadas. Falava de ranchos à beira chão, todos cheios de buracos onde a lua faz clarão. Contava a marcha das comitivas varando o sertão, conduzindo boiadas que atravessavam os cafezais para chegar nas festas do Divino, nas corrutelas ao longo das estradas boiadeiras.

Rolando Boldrin cantava um Brasil engolido pelo progresso, que ainda não tinha as jamantas que cruzam as estradas carregando uma boiada. Elas estavam distantes, não faziam parte do nosso dia a dia, para o bem e para o mal.

Sentado em seu palco com jeito de casinha de pau a pique perdida na imensidão iluminada pela lua cheia, Rolando Boldrin era o cantador e o mágico que mantinha viva a tradição do antigo e singelo interior brasileiro, mais inocente e menos rebuscado do que o país real em que vivemos hoje.

Moda de viola, catira, catuletê, novos compositores, todos os ritmos deste enorme chão brasileiro tinham espaço no espaço de Rolando Boldrin.
Sua vida foi isso: resgatar e manter as tradições brasileiras vivas. Ele fez isso com seus olhos bons. Que Deus o receba no sertão do céu!

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Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.