As quaresmeiras estão chegando
[Crônica do dia 22 de janeiro de 2003]
As quaresmeiras começam a florir. Por conta disso, São Paulo que nas férias fica mais gostosa e mais humana, continuará, mesmo com a volta do rodízio, mais gostosa e mais humana.
Não tenho números, mas acho que as quaresmeiras são as árvores mais plantadas da cidade. Não tem canto em que não tenha pelo menos uma, e ela, agora, começa a florir, no contraponto contraditório entre seu nome e sua florada.
A quaresma é uma época de reflexão, uma época circunspeta, às vezes até triste, porque nela o católico faz penitência pela morte do Cristo.
Durante séculos, a quaresma foi um período em que mal se podia rir. Tudo, nela, era pecado e até hoje, nesta época as igrejas vestem seus santos de roxo, antecipando o martírio do Cristo, na sexta feira da paixão.
A maioria das quaresmeiras tem flores roxas e sua florada também se estende pelos dias da quaresma, mas, ao contrário das igrejas, o roxo das quaresmeiras é uma explosão de vida, de alegria e de cor, que toma a cidade de assalto com a violência das grandes emoções, enchendo cada esquina com a alegria de suas flores cobrindo as árvores, escondendo o cinza e tapando o feio.
As quaresmeiras são um exército aguerrido e numeroso, por isso têm a florada exuberante espalhada pela cidade inteira, indistintamente, democraticamente, entre ricos e pobres, entre verde e cinza.
Mas, quem sabe mais importante que tudo, as quaresmeiras são árvores daqui mesmo, da mata atlântica, e quem viaja para o litoral pode acompanhar o dueto das árvores na cor que explode da mata.
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